A colheita da safra 2014/2015 do Brasil ainda está em andamento e os sojicultores já negociam antecipadamente grandes volumes de soja do próximo ciclo, que começa a ser cultivado no segundo semestre. Eles estão aproveitando a alta do dólar futuro ante o real e tentam reduzir riscos com uma eventual queda das cotações na Bolsa de Chicago (CBOT).
O dólar futuro mais alto do que o à vista tem incentivado esse tipo de operação. Hoje, a referência para o dólar em março e maio de 2016 ultrapassava os R$ 3,40. Com os futuros de soja para março deste ano e o mesmo mês de 2016 em patamares não muito distantes - US$ 9,8650 por bushel para março de 2015 contra US$ 9,7250 por bushel para março de 2016 - e pouca perspectiva de alta na CBOT de agora em diante, produtores preferem assegurar parte das vendas nos níveis atuais.
O analista Fernando Pimentel, da consultoria Agrometrika, assinala que a perspectiva de incremento de área nos Estados Unidos, a recomposição dos estoques no país, o excedente de produção na Argentina e no Brasil e uma possível mudança na política monetária norte-americana, com potencial de valorizar ainda mais o dólar ante as principais moedas, tendem a pressionar os preços futuros. Com isso, existe a expectativa no mercado de que as cotações possam recuar a patamares entre US$ 0,50 e US$ 1 abaixo dos atuais daqui a um ano, segundo Pimentel.
A possibilidade de recuo na CBOT seria o principal estímulo para a comercialização da safra 2015/2016 neste momento. "Essa seria uma oportunidade de fixar a soja de 2016 em um patamar de Chicago maior", explicou o analista. Além disso, existe demanda de empresas de exportação interessadas em garantir o fornecimento de determinados volumes por estarem iniciando ou ampliando operações em portos do Arco Norte. "Há uma atitude mais agressiva de exportadoras com logística nova em termos de alocação de volume para as novas estruturas."
Para os que receiam um cenário mais desfavorável de comercialização, o analista diz que a venda em dólar, com posterior fechamento do câmbio, seria uma possibilidade a considerar, caso os custos da próxima safra ainda não tenham sido fixados em reais. "Fazer fixação da venda em real para 2016 é um risco grande. Você estaria correndo o risco de cruzar a moeda em relação ao custeio em dólar." O risco ao produtor é o dólar mais baixo no momento da comercialização da soja e maior no período de compra dos insumos. Ele ressaltou que, em um ambiente volátil como o atual, pode custar caro fazer hedge (proteção) cambial para esse tipo de operação. "Nesse ambiente de incerteza, o mercado de câmbio pode se mover para os dois lados", disse o analista.
Para Pimentel, a incerteza sobre o câmbio exige atenção do sojicultor. "Se você comprar insumo em dólar e vender a safra dolarizada, tentando casar prazos de compra e venda, consegue criar um hedge natural para a operação. Não vai ficar cambialmente exposto", explicou. Segundo ele, há uma possibilidade de haver entre 2015 e 2016 um pico do dólar ante o real, com potencial queda, caso o cenário político e econômico se acomode, como ocorreu em 2003 e 2004.
Em Nova Mutum, parte dos produtores que estão fazendo negociações futuras da safra 2015/2016 ainda não travou em reais a despesa com insumos para a próxima temporada. Além disso, a conta em dólar também não é tão atrativa na região - US$ 15,80 por saca para embarque em fevereiro e pagamento em março, ante os cerca US$ 20 por saca desejados pelo produtor. "A soja 2016 está em um preço bom em reais. Produtor está ciente de que, se o dólar ceder, venderá a um valor abaixo do atual, por isso prefere garantir, ter alguma coisa certa", salientou Luchesi, da MT Grãos, chamando a atenção para o fato de que os preços em reais no spot e no futuro na região estão próximos. "Não tem fundamento que justifique a forte alta da soja", ressalta. "Produtor está preferindo apostar na venda em números bons, mesmo com a moeda em aberto no custo."
Em Ponta Grossa (PR), produtores também estão aproveitando para vender soja da safra 2015/2016, mas com o custo dos insumos fixado em moeda local. Na quinta-feira, 12, foram negociados lotes a R$ 67 por saca e R$ 68 por saca posto em Ponta Grossa em abril de 2016, com pagamento em maio do ano que vem, ante R$ 66 por saca no início da semana. "Desde o R$ 65 por saca, vem rodando alguma coisa", disse o corretor Adriano dos Santos, da SafraSul. Ele estima que 3 mil a 5 mil toneladas tenham sido movimentadas esta semana. Segundo o agente, comparando valores atuais dos insumos em real e os valores das propostas de comercialização futura, ainda seria possível obter remuneração razoável. "É menor do que o produtor estava acostumado, mas ainda dá uma margem." A venda antecipada serviria para garantir o ganho atual, em meio à incerteza sobre o cenário de câmbio. "Se hoje o custo, por exemplo, for de R$ 42 a R$ 43 por saca, e o produtor travou a R$ 68 por saca, tem essa margem garantida."