Por Glauber Silveira, presidente da Aprosoja Brasil.
Durante a nossa missão à Europa ficou claro que a certificação da soja de todos os demais produtos é um caminho sem volta. Os consumidores querem saber a origem do que estão comprando, como foi produzido e onde. Mas ficou claro também que ele não quer pagar nada a mais por isto. Pesquisas realizadas por importantes universidades europeias confirmam que existe uma diferença grande entre o pensamento do cidadão e do consumidor. O cidadão concorda e deseja proteger tudo e todos, porém quando o consumidor quer comprar o melhor, pelo menor preço.
A Associação Internacional de Soja Responsável ou Round Table on Responsible Soy Association (RTRS), em inglês, é a iniciativa que a Europa quer adotar como padrão internacional de certificação. O objetivo deles é alcançar um consenso sobre a forma mais responsável de produzir e processar soja.
Porém, este modelo de certificação nem de longe conseguirá ser consenso e muito menos irá representar um Plus aos produtores brasileiros. Uma vez que na Europa os produtores, que apesar de serem apenas 3% da população, têm outro peso. Lá eles não aceitam nenhum item de certificação que não gere mais produtividade e melhor rentabilidade, ao contrário do Brasil, onde toda legislação parece pouco se preocupar com o aumento de produtividade e renda do produtor.
Em conversas com pesquisadores da universidade de Haia, na Holanda, debati que a proposta de certificação não pode criar leis ou restrições maiores que as já existentes nos países de origem. Por
exemplo, no Brasil um produtor só será certificado no RTRS se tiver Reserva Legal, enquanto isto na Argentina ele será certificado mesmo não tendo reserva.
Dentro deste contexto os próprios pesquisadores afirmaram que a cerificação mais complexa será a brasileira, pois é o país com as legislações mais complexas. E se o novo Código Florestal não
consolidar as áreas já abertas, poucos produtores conseguirão ter a certificação. E aí fica a pergunta: como venderemos para a Europa? Em 2015 eles só comprarão soja certificada.
Mas isso não servirá apenas para a soja, eles também não comprarão a maçã de um produtor do sul do Brasil, que produz há 50 anos sem Reserva Legal, mesmo tendo Área de Preservação Permanente, muitas vezes em áreas abertas na época do descobrimento do Brasil, onde não existiam as atuas regras. O novo Código precisa reconhecer isto, não pode retroceder.
Na Europa, eles não têm Reserva nem APP e mesmo assim serão certificados e com um preço melhor que o do brasileiro, mais competitivo. O Brasil, que é um país exportador, perderá fortunas. Pode até vender mais, mas sem dúvida venderá com deságio, mesmo a nossa produção sendo a mais sustentável do planeta. Infelizmente temos a legislação mais insustentável.
O problema é que o Governo brasileiro não entendeu ainda que por trás de tudo isto existe um interesse comercial muito forte. A Holanda que tem 60% do seu território abaixo do nível do mar, todo drenado, com canais gigantescos, nunca em vi em nenhum país uma interferência tão grande no meio ambiente, nem mesmo em Dubai, onde as construções avançaram mar adentro. A Holanda tem que se preocupar sim com a produção sustentável, certificada, mas daí
querer que o Brasil deixe de se desenvolver, exigindo e impondo regras impossíveis de serem cumpridas. Seria mais fácil pegarmos um pedaço do país e darmos a eles, para se mudarem.
Além de tudo, na Europa o Governo garante mais de 35 bilhões de euros em subsídios para evitar que os produtores saiam das fazendas e as áreas agricultáveis retornem a ser florestas. Ora, lá eles não querem perder área produtiva, mas os brasileiros não podem aproveitar as áreas já abertas ou o direito de utilizar o que já têm.
China e os EUA também já estão negociando adesões a este modelo de certificação europeu. É muito fácil para estes países adotarem este modelo de produção. China não tem nenhuma legislação ambiental e trabalhista vigente. Para se ter uma noção, os trabalhadores chineses conseguiram este ano apenas quatro dias de férias não remuneradas. Assim fica simples e fácil para eles se certificarem. Já abriram tudo, não têm mais floresta, não precisam de APP. Nos EUA, o governo paga ao produtor para não plantar.
Sendo assim, a certificação pode trazer ao Brasil um deságio à soja, ao algodão, à carne, ao minério de ferro, às frutas e a outros produtos como roupas, sapatos, cimento. A China tem interesse grande nisso, pois poderá, enfim escalpelar os produtores brasileiros, que terão que vender seus produtos com deságio, em desvantagem aos americanos, que conseguirão facilmente adotar à certificação e vender para o resto do mundo com um preço competitivo. A consequência será a estagnação da produção brasileira, enquanto assistiremos de camarote nossos vizinhos Uruguai, Bolívia, Venezuela e Chile, entre outros, expandirem sua produção.
O mundo comprará mais barato do Brasil, o povo brasileiro perderá renda, mas nosso presidente ou presidenta será aplaudido em um grande evento na Europa. É isso que queremos para o nosso país?
Fonte: Aprosoja // Glauber Silveira