A Comissão de Defesa Sanitária Vegetal (CDSV) do Ministério da Agricultura, em Mato Grosso, estuda proibir o plantio de soja a partir de 31 de dezembro, no Estado. A intenção é colocar fim à semeadura da oleaginosa na segunda safra, a chamada soja sobre soja ou sojinha. A medida ainda é embrionária, mas divide opiniões. Entre os próprios produtores, os mais interessados no desfecho que a proposição terá, há quem se posicione contra e a favor. O principal argumento para a restrição é a segurança fitossanitária local, ou seja, evitar que as plantas se transformem em abrigo e alimento por longo período de fungos e insetos, como o causador da ferrugem asiática e a lagarta Helicoverpa armigera, respectivamente.
Neste ano, em função de um cenário sem indicações ao milho no segundo semestre do ano passado quando a decisão do que plantar nesta safra era tomada, fez com que produtores optassem pela sojinha no lugar do cereal, já que para cultivar algodão é preciso toda uma estrutura específica prévia. A sojinha também se mostrou rentável dentro das projeções do mercado futuro. Com todo esse contexto, estima-se que nesta safra cerca de 120 mil hectares – recorde histórico – estejam neste momento abrigando a oleaginosa que se desenvolve em todas as regiões do Estado. Há relatos de que a opção custou caro para alguns, que gastaram mais para controlar doenças e pragas e estão colhendo de dez a quinze sacas por hectare. Na safra principal o grão obteve rendimento médio neste ano de 52 sacas.
O coordenador da Comissão, Wanderlei Dias Guerra – que defende a restrição de plantio - frisa que a situação fitossanitária do Estado é preocupante e deve ficar pior a cada safra. “A segunda safra está infestada de lagartas. A soja sobre soja, milho e soja guaxos e a má destruição das soqueiras de algodão estão dando sobrevida ao fungo da ferrugem, à Helicoverpa e às pragas de modo geral”.
Ele sentencia que a safrinha de soja é sinônimo de perdas. “Seja do ponto de vista financeiro, e principalmente produtivo. Essa safrinha é mais afetada entre as culturas de segunda época porque sucede o momento em que a ferrugem mais atinge a soja, variedades tardias sob clima bastante chuvoso. Esses esporos passam para a sojinha, que vai se desenvolver em um período mais seco, o que coloca em risco duas vezes a produção esperada, seja pela alta incidência da doença como pela possibilidade de perdas em decorrência do clima”. O plantio da soja verão ocorre entre setembro e mais tardar início de novembro. Já a sojinha foi semeada após a colheita da ‘sojona’.
Dias Guerra lembra do peso que a sojinha carrega. No final da safra normal as plantas já estão com cinco, seis aplicações de fungicida a contar de novembro, quando em geral recebeu o primeiro tratamento. “O cenário que se desenvolve é o seguinte. Os esporos que sobreviveram ficam mais resistentes. A ferrugem é uma doença policíclica, a cada 15 dias tem um ciclo novo, ou seja, durante o desenvolvimento da safra temos oito ciclos de 15 dias, então são oito aplicações. A soja safrinha vem de uma sequencia de pulverizações e com fungos menos sensíveis ao fungicida e que vão se desenvolver sobre a safrinha e esperar pelo novo ciclo da soja principal. É esse esporo menos sensível ao produto que sobrevive na safrinha. E é esta ferrugem menos sensível ao fungicida que fica se multiplicando e gerando esporos mais agressivos e uma maior necessidade de aplicações a cada safra. O problema, é que além do maior desembolso financeiro, a safrinha de soja começa a ficar estressada pela quantidade de aplicações para o controle adequado da ferrugem e acaba não tendo eficiência e a produtividade esperada”.
E completa: “com o quadro de sojinha e de plantas guaxas de soja em pleno desenvolvimento da entressafra - dentro do vazio sanitário, que servem de hospedeiro ano a ano para a ferrugem - temos uma doença cada vez mais agressiva e mais virulenta que a anterior”, exclama Dias Guerra.
OUTRO LADO – A Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado (Aprosoja/MT) espera por embasamentos técnicos do próprio Ministério. “Não queremos tirar o direito do produtor de exercer a atividade que melhor lhe convier. Mas é preciso ter responsabilidade com sua propriedade e com a vizinha. Esse plantio não pode ser motivo para propagar doenças. Agronomicamente, até esse momento, eu não vejo impedimento em fazer soja sobre soja. Mas não vamos debater isso de forma aleatória e na base do ‘achismo’. Vamos pedir a intervenção de técnicos do ministério e dai nos posicionarmos quanto a essa questão”, frisa o presidente Carlos Fávaro.
O diretor técnico da entidade, Nery Ribas, concorda com a posição de estudar melhor as consequências da safrinha e lembra que nada melhor para sustentar ou não uma provável proibição são as ocorrências desta safrinha. “Temos um laboratório neste momento no campo. Há muito que discutir, ouvir, conhecer para então tomar uma decisão”.